As consequências da Guerra Fria na América Latina: o exemplo do Brasil

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A Guerra Fria polarizou o mundo em dois campos controlados por superpotências que se dividiram em regimes pró-comunistas e anticomunistas, são eles, respectivamente: URSS e EUA. Essa polarização política, econômica e ideológica trouxe consequências importantíssimas aos países da América Latina, como as ditaduras militares e o embargo econômico em Cuba. O objetivo deste ensaio é descrever o processo da Guerra Fria e suas consequências, usando como exemplo o milagre econômico do Brasil.

Segundo Eric Hobsbawm, mal terminava a Segunda Guerra Mundial quando o mundo se viu diante de uma disputa que tornava muito possível uma Terceira Guerra. A Guerra Fria entre os Estados Unidos e a extinta URSS, dominou o cenário internacional na segunda metade do século XX. Famílias inteiras viam seu cotidiano pautado na possível batalha nuclear entre essas duas potências. Mesmo aquele que não acreditava num conflito direto entre os dois países achava difícil ser tão pessimista.
(...) a Guerra Fria que se instalou no mundo após a segunda onda de revolução mundial foi uma disputa de pesadelos. Fossem ou não justificados, os medos do Oriente ou Ocidente eram parte da era de revolução mundial nascida em Outubro de 1917. Mas essa própria era estava para acabar, embora levasse mais quarenta anos para que se pudesse escrever o seu epitáfio. Apesar disso, mudara o mundo, embora não da maneira como esperavam. (HOBSBAWM, 1995).
Os governos das duas superpotências aceitaram a distribuição global de forças no fim da Segunda Guerra. O mundo se dividia em dois, sendo um lado controlado pela URSS, que exercia forte influência na parte comunista do globo. Do outro lado havia os EUA, que controlavam predominantemente o outro lado do mundo capitalista.

A América Latina começa no que geograficamente é a América do Norte e se caracteriza como um continente castigado pela Colonização do século XIX, mais precisamente iniciada em 1492. O continente tem, historicamente, uma dependência econômica, seja por países colonizadores ou mesmo os EUA. Tendo sua colonização caracterizada pela exploração de matéria-prima, na América Latina, tudo sempre foi atrelado ao que a Europa queria no momento e nunca desenvolveram algo sozinhos. Além disso, podemos somar a desigualdade social e a exploração por latifúndio, monocultura e escravismo.

Desde 1823 os EUA já estavam com olho na América Latina, e entendem que são donos dessa região. Na Doutrina Monroe determinaram três princípios gerais, que foram um prelúdio ao que viria a acontecer durante a Guerra Fria: o continente americano não pode ser objeto de recolonização; é inadmissível a intervenção de qualquer país europeu nos negócios internos ou externos de países americanos, e, finalmente; os Estados Unidos, em troca, se absterão de intervir nos negócios pertinentes aos países europeus. Isso já era uma projeção para o futuro, na qual o mundo se dividiria entre EUA e URSS.

No século XIX temos as independências de países da América Latina. Após as independências os países continuam dependentes, pois estavam cheios de dívidas com os países que ajudaram na independência. Inglaterra era um deles, que, por conta da Revolução Industrial, era um país mais desenvolvido, cheio de dinheiro, com necessidades de matéria-prima e demanda.

Lógica de exploração: quem explora é quem é hegemônico naquele momento. Essa era a oportunidade que os Estados Unidos esperavam para se verem donos do continente. A América do Norte estava bem, como sempre. Pois a sua colonização foi de povoamento. Plantavam coisas diversas, pequena propriedade, acúmulo de capital. Quando se tem acúmulo de capital se pode comprar a vontade, assim você expande: economicamente, territorialmente e politicamente.

Entre as décadas de 50 e 80, período áureo da Guerra Fria, o termo “milagre econômico” foi utilizado para caracterizar o crescimento da Alemanha, Itália, Japão, Coréia e Brasil. Nessa fase, a taxa média anual do Brasil foram as mais altas e descontínuas, com média de 8%, entre os anos 1955 e 1960, de 11% entre 6677 e 73, e 6% entre 74 e 80, porém com queda significativa no período de 61/731. (FIORI, 2015).
A lógica da Guerra Fria pesou decisivamente na origem do que chamamos de "milagres econômicos" e na transformação posterior do Brasil, que junto com os países citados acima, era peça central do poder econômico dos Estados Unidos no conflito com a URSS, ao menos na década de 702. (FIORI, 2014).

Os anos 50 ficou conhecido no Brasil como "Anos Dourados" do governo JK. Havia otimismo e forte influência dos Estados Unidos, com financiamentos e incentivo ao investimento de capital norte-americano, além de difusão cultural.

O plano para a América Latina era marcado pelo expansionismo dos EUA através do investimento no comércio unilateral, implantação de grandes empresas multinacionais; fluxo de capital; influência cultural; Tratado Interamericano de Ajuda Recíproca (TIAR), que consistia no rompimento diplomático entre América Latina e URSS; treinamento de oficiais do hemisfério, cursos com cerca de 60 mil oficiais das forças armadas e polícias da AL para utilização de métodos para forçar a confessar, o uso de sevícias e atemorização psicológica; surgimento da ideologia da segurança nacional.

O Brasil foi aliado dos EUA na Guerra Fria e aceitou a oferta do Acordo Militar Brasil-EUA, em 1952. Com isso, o Brasil se transformou no "pivot" central da estratégia desenvolvimentista norte-americana, para a América do Sul. Essa política foi introduzida pelo governo JK, completamente alinhado com os EUA e o colonialismo europeu. Depois, em 1964, o regime militar ficou no comando. A partir de 64 começou com o Brasil os golpes militares e assim se instaurou o efeito dominó dos golpes militares, Argentina em 1966, Bolívia em 1971 e Uruguai e Chile em 1973.

A partir da relação de ameaças e provocações mútuas entre EUA e URSS, houve um sistema internacional estabilizado. Esse conflito foi decisivo para a relação dos EUA com a América Latina, a partir do posicionamento dos países envolvidos. Cuba foi a única nação do continente americano que adotou o socialismo como sistema político e tinha o apoio da URSS, que importava os principais produtos cubanos, como açúcar, arroz, tabaco, entre outros; além de fornecer subsídios financeiros ao país. Os norte-americanos aceitaram um país da América Latina comunista, porém com ressalvas. A consequência dessa posição foi o embargo imposto pelos EUA, em 1961. O período dos anos 60 e 70 testemunharam medidas para inserir os países latino-americanos nos ideais norte-americanos capitalistas.

José Luis Fiori diz que entre os anos 1968 e 1973 houveram acontecimentos e decisões nos planos econômico e político internacionais que foram responsáveis por uma "inflexão histórica de dimensões universais". Esse foi um período que se encerrou a, chamada por Eric Hobsbaw, em 1994, de "era de ouro" do capitalismo. (FIORI, 1997).

Depois de quase três décadas de “milagre econômico”, o processo foi interrompido pela crise americana de 1970, uma nova mudança política internacional dos Estados Unidos e a reaproximação da China. Assim, os EUA decidem iniciar a desregularão do seu mercado financeiro e iniciam uma lenta construção de um novo sistema monetário internacional.

A estratégia permitiu a desconstrução da URSS e o fim da Guerra Fria, mas desestabilizou a Alemanha, Japão e até mesmo o Brasil, pois esvaziou, segundo Fiori (2012), o papel econômico que foi ocupado por esses países nas primeiras décadas da Guerra Fria. Dessa maneira, o crescimento econômico médio anual caiu entre 1973 3 1990 e o Brasil entrou num longo período de estagnação. Em contrapartida, a China se transformou no novo “milagre econômico” do sistema capitalista.

Na atual conjuntura, o Brasil é muito menos desenvolvido que Alemanha e Japão, porém, tê-lo ainda como aliado é importante pois dispõe de recursos naturais, além de ser autossuficiente na questão alimentar e energética.


Fontes:

FIORI, José Luis. "Globalização e Governabilidade Democrática" In: PHYSIS, Revista de Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, UERJ, 1997, pp.137-161.

FIORI, José Luis. Os "milagres econômicos" da Guerra Fria. Publicado em 28 de dezembro de 2012. Disponível em: . Último acesso: 14 de maio de 2015.

HOBSBAWM, Eric. Era dos Extremos - O breve século XX, 1914-1991. São Paulo: Cia das Letras, 1995.

Livro: A Insustentável Leveza do Ser

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Autor: Milan Kundera
Data de publicação: 1984
Editora: Nova Franteira
Páginas: 314


Minha história com esse livro é muito interessante. Porque é dessas obras que todo mundo te manda ler, que é maravilhosa e muda a vida das pessoas. Eu levei fé e decidi marcar como desejado no Skoob. Diretamente foi postado no meu Twitter que gostaria de ler  "Insustentável Leveza do Ser", de Milan Kundera. Recebi uma curtida no tweet. Fiquei com aquilo na cabeça.

No dia seguinte, chego no trabalho e me deparo com o livro na minha mesa. O amigo que curtiu meu tweet me trouxe o exemplar. É daqueles amarelados pelo tempo, que precisamos manusear com delicadeza de não se desfaz. Eu fiquei encantada e aquele momento me caiu como um sinal. Era tempo de ler Milan Kundera.

Definitivamente é o título de livro mais bonito que já se viu. É um dos meus favoritos. E me intriga, pois eu não conseguia entender muito bem o que significava isso. Eu tinha que ler esse livro naquele momento. Pois bem.

A história se passa na Primavera de Praga, então Tchecoslováquia, em 1968. Nessa época o país estava dominado pela União Soviética. A consequência desse período na vida dos personagens é retratada no livro. Eles são quatro: Tereza e Tomas, Sabina e Franz, que representam a leveza e peso.

Os quatro personagens representam a dicotomia entre leveza e peso. Encontro de Tereza e Thomas foi uma sucessão de acasos. Thomas não se prende a ninguém e é mulherengo, mas diz amar Tereza. Esta carrega o peso de viver. quer se ligar a alguém e se preocupa com seu corpo.
"O amor não se manifesta pelo desejo de fazer amor (esse desejo se aplica a uma série inumerável de mulheres), mas pelo desejo do sono compartilhado (este desejo diz respeito a uma só mulher)."
Sabina mostra a leveza do ser, a liberdade. É a personagem mais leve e sente fascínio pela traição. Não só amorosa, mas com o pai, tradições, regras...
"Mas o que é trair? Trais é sair da ordem. Trair é sair da ordem e partir para o desconhecido. Sabina não conhece nada mais belo que partir para o desconhecido."
Franz é preso a um casamento e trai a esposa com Sabina, mas busca ser livre é o sonhador do romance. Ele busca se envolver com algo, está cansado da sua vida. É um exemplo de leveza insustentável. Não está satisfeito com sua leveza de viver.

Kundera usa a teoria do eterno retorno de Friedrich Nietzsche, que questiona a ordem das coisas. Cita também Parmênides, que no século VI antes de Cristo, dividiu o universo em duplas de contrários, como por exemplo, grosso e fino, quente e frio, luz e escuridão, etc. Mas o que seria positivo, o peso ou a leveza? Para Parmênides o leve é positivo, já o pesado é negativo.
"Teria ou não razão? Essa é a questão. Uma coisa é certa. A contradição pesado-leve é a mais misteriosa e a mais ambígua de todas as contradições."
Qual das duas formas de vida escolher? Essa é questão imposta no livro. Assim, Kundera ilustra seu questionamento apresentação o relacionamentos dos quatro personagens. A despreocupação  de alguns e o envolvimento de outros. Quanto mais pesada a vida, mais real ela é.






Livros de agosto

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Eu nem acredito que consegui alcançar minha meta e ler os quatro livros de julho! Em breve resenharei sobre alguns deles.

Agora, começou agosto e todo mundo sabe que é um mês eterno. Então, subi as expectativas e coloquei cinco livros na lista.

Estava morrendo de saudades de Sophie Kinsella e tinha uma mini coleção da série Becky Bloom. Descobri que tenho quatro livros e só li dois dessa série. Heresia, eu sei. Então vou me redimir e coloquei na minha lista.


As Listas de Casamento de Becky Bloom e A Irmã de Becky Bloom, ambos de Sophie Kinsella

Eu sou apaixonada pela Becky e me sinto mal pelo filme não ter virado uma franquia maravilhosa. Afinal, temos OITO livros divertidíssimos para acompanhar!



O Incêndio de Tróia, de Marion Zimmer Bradley

Comecei a ler esse livro há muito tempo. Nem sei o que aconteceu, mas tive que parar de ler. Agora, preciso terminar, pois esse livro nem meu é! Isso mesmo, sou uma pessoa péssima.





O Inimigo de Deus, de Bernard Cornwell

Tenho um caso de amor com o Bernard Cornwell. Descobri a "As Crônicas de Artur" pelo meu namorado. Ele me deu de presente "O Rei do Inverno" - que li há muito tempo e me encantei completamente -  e também o "O Inimigo de Deus". Quero ainda adquirir o "Excalibur" e encerrar a leitura.


A Elegância do Ouriço, de Muriel Barbery

Descobri esse livro no canal da Tatiana Feltrin (maravilhosa)! Ela classificou muito bem o livro e me interessei pela história.


Demônios da Garoa - Samba de Gaiato

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 Na década de 20, período pós-República, o Brasil passava por uma fase de valorização de sua cultura. Assim, o samba, escolhido como símbolo do país, foi a raiz da música popular brasileira. O ritmo ficou conhecido como uma expressão cultural, que foi o elemento central para a constituição da identidade nacional dentro e fora do país. Está no imaginário popular por ser uma representação forte de nosso passado, que permanece no presente e mantém o nacionalismo vivo através dos séculos.
O gênero musical teve sua origem a partir das primeiras manifestações culturais dos negros africanos escravizados, durante o período de colonização do Brasil. A partir de 1888, nos períodos de festas, a mistura musical de ex-escravos, que migraram do nordeste para o Rio de Janeiro, se manifestava nos morros fluminenses. O ritmo era chamado de chula, que na época se constituía como qualquer verso cantado à base de violão, cavaquinho e flauta, além de pandeiro e palmas. Mas já caracterizava o que conhecemos como samba (TINHORÃO, 2004, p.263-267).
As festas no interior paulista contribuíram para o surgimento de um samba diferente daquele tocado nas festas cariocas. Aqui as manifestações eram em homenagem aos festejos de Pirapora do Bom Jesus. De acordo com o site da prefeitura da cidade fazendeiros vinham de diversas partes, junto com seus escravos e se reuniam em galpões para rezar e cantar ao Bom Jesus de Pirapora. A partir da década de 1910, a presença crescente dessas manifestações religiosas transformou a cidade de Pirapora num reduto de samba paulista, fato que influenciou a criação dos futuros cordões carnavalescos, que, por sua vez, deram origem às primeiras escolas de samba paulistanas.
Em se tratando do crescimento da cidade de São Paulo, é possível observar o nascimento e desenvolvimento de diversas vertentes culturais, dentre elas, a música. O samba paulistano, surgido em meados da década de 30, configura-se como representação típica da cultura musical paulistana, que trouxe consigo diversos representantes.
Nos bares de São Paulo, a música tinha como principal característica o improviso e o coro. Além disso, o som recebia a contribuição de instrumentos como o cavaquinho e o violão, ambos de origem europeia, e da batida que vinha da influência africana do gênero. Para o sambista e pesquisador Osvaldinho da Cuíca (2009, p. 91-99), o momento de definição do samba paulistano foi o movimento da cultura italiana na cidade, que mesclava o linguajar imigrante em suas formas de fazer música. A influência italiana do bairro da Mooca e o linguajar dos engraxates da Praça da Sé caracterizaram o que ficou conhecido como “estilo gaiato”, marca registrada do grupo de samba Demônios da Garoa, que completou 70 anos de carreira em 2013 e é um dos representantes da cultura paulistana.
Demônios da Garoa e o estilo gaiato são os objetos de estudo de um Trabalho de Conclusão do Curso de Jornalismo. O grupo foi formado em 1943, mas só alcançou reconhecimento no programa de calouros A Hora da Bomba, na rádio das Emissoras Unidas, em 1944. O conjunto se consolidou no cenário musical brasileiro como principal intérprete do compositor Adoniran Barbosa, a partir dos anos 50. As primeiras músicas gravadas foram Malvina, ganhadora do carnaval de 1951, e Joga a Chave, ganhadora do carnaval de 1952. O grupo se firmou como representante de um samba genuinamente paulistano. O marco foi a música Trem das Onze que fez com que os integrantes se tornassem campeões do concurso carnavalesco promovido pela prefeitura do Rio de Janeiro, quando a cidade completava 400 anos, em 1965.
Nesses 70 anos o grupo conquistou diversos prêmios, como por exemplo: Rei Majestade, Roquete Pinto, Chico Viola, Prêmio Sharp de Música, Prêmio Ari Barroso, Chave de São Paulo, entre outros. Além disso, em 1994, entrou para o Guinness Book como Conjunto Vocal Mais Antigo da América Latina em Atividade.

O resultado desse projeto pode ser conferido abaixo:




Autoras:
Domitila Gonzalez
Danielle Andrade
Rejane Santos
Rebeca Rodrigues
Taís Souza

Multiculturalismo e a relação entre imigrantes, suas identidades e a sociedade em que se estabeleceram

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A queda do Muro de Berlim no século XX transformou o mundo num sistema multipolarizado e globalizado. O planeta se tornou mais interligado econômica e politicamente e isso favoreceu o deslocamento das pessoas no globo de maneira desordenada e imprevista. O resultado, segundo Clifford Geertz (2001), é que novas linhas são traçadas, identidades expandem, mudam de forma, ramificam-se e desenvolvem-se, o que ocasionou choques entre os grupos. Dentro desse panorama, foi preciso pensar numa nova forma de política, forma essa que, precisava pensar na religião, raça, língua ou afirmação étnica de forma racional, sem suprimir, demonizar e assim acabar com o abuso de poder. Para Geertz (2001), é preciso obter uma melhor compreensão sobre cultura e a estrutura como as pessoas vivem no mundo, a partir das suas individualidades, estilos e diferenças.

Assim, as sociedades modernas começaram a fragmentar elementos culturais, como por exemplo, classe, gênero, sexualidade, raça e nacionalidade. Essas mudanças interferiram na nossa identidade pessoal e abalaram a ideia que temos de nós próprios como sujeitos integrados.

Para começar, cultura não é transmitida por genes, ela não é uma questão de raça. Existem muito mais culturas humanas do que raças humanas”, afirma Claude Lévi-Strauss no texto Raça e História (1952). Para o autor Adam Kuper (2002), a cultura é uma questão de valores, cosmologia, estética e os princípios morais são expressados através de símbolos, sendo a cultura um sistema simbólico.

Culturas elaboradas por pessoas de uma mesma raça podem divergir tanto quanto culturas de grupos racialmente afastados. A diversidade nasce, segundo Lévi-Strauss (1952), a partir do contato com culturas diferentes, portanto, não se estabelece a partir do isolamento entre povos. Muitos costumes desenvolvidos por uma população tiveram origem não apenas de uma necessidade interna, mas sim de uma vontade de não serem atrasados em relação a um grupo vizinho, que possuía uma tecnologia diferente e mais avançada para conseguir algo para aquela sociedade.

No entanto, é preciso saber que a diversidade cultural pouquíssimas vezes pareceu algo natural, resultante das relações, sejam elas diretas ou indiretas, entre as sociedades. Lévi-Strauss (1952) ainda corrobora que, a diversidade cultural é vista como monstruosidade ou escândalo desde a Antiguidade. Afinal, “o que faz uma nação é o passado, o que justifica uma nação em oposição a outra é o passado”, como já escreveu Eric Hobsbawm (2000, p.271).

Adam Kuper utiliza uma citação de David Chaney (1994, p. 208) para dizer que a cultura representa uma ponte entre o indivíduo, suas identidades e a sociedade. Já James Clifford é usado para afirmar que a cultura serve para fazer diferença e por isso é preciso preservar “as funções diferenciais e relativistas do conceito”.

Existem hoje teorias modernas sobre cultura, na qual reciclam as anteriores. Para entender cultura é preciso desconstruí-la e explorar suas configurações, na qual elementos como língua, técnicas, ideologias e rituais estão relacionados entre si.

Explicando as operações que contém uma cultura, Michel de Certeau (1994) expõe pensamentos sobre relatos cotidianos e disserta sobre a noção de espaço. Para ele, os relatos transformam lugares em espaços e vice-versa e organizam as relações entre os indivíduos. Para que um lugar possa se tornar um espaço, é necessário que o indivíduo exerça dinâmicas de movimentos através do uso. É preciso que o lugar seja ocupado para ser transformado.

Segundo Hector Díaz-Polanco em Diez teis sobre identidad y globalización (2009), os idealistas da globalização prometeram não só um mundo igualitário socioeconomicamente, mas que se iniciaria uma era de grandes transformações no que se refere à igualdade entre classes e grupos nacionais. Porém, não imaginaram que o processo se daria de forma contrária.

Dentro disso, para explicar alguns processos da globalização, será utilizado o texto do Boaventura de Sousa Santos, Para uma concepção Intercultural dos Direitos Humanos, do livro chamado A Gramática do Tempo: para uma nova cultura política (2006). Souza Santos conceitua “localismo globalizado” como um processo pelo qual um fenômeno é globalizado com sucesso. Há também o “globalismo localizado” que pode envolver eliminação de comércio tradicional ou mesmo a criação de enclaves de comércio.

Para Stuart Hall (2011, p. 3-4), a globalização tem impacto na identidade cultural dos indivíduos. Assim, as sociedades modernas estão em constante mudança. A sociedade não é unificada e bem delimitada. Ela se produz através de mudanças evolucionárias a partir de si mesma.

Sousa Santos (2006) acredita que exista uma relatividade cultural, na qual se definiu como valores universais considerados fundamentais para a sociedade. Dessa maneira tudo é olhado do ponto de vista Ocidental, a questão sobre universalidade é baseada em uma dada cultura, olhada de um único ponto de vista.

Os movimentos anti-colonialistas sucedidos pela Segunda Guerra Mundial tiveram consequências na formação das minorias étnicas no Estado-nação moderno. Antes disso, existia um paradigma assimilacionista, que ansiava para que os imigrantes ingressassem de forma gradual e rápida na sociedade receptora.

De acordo com Hans Vermeulen, no livro Imigração, Integração e a Dimensão Política da Cultura (2001, p. 14), o conceito de assimilação é “um processo gradual, a-problemático e linear – alguns falam mesmo de teoria ‘linear’ (Gans, 1979) – pelo qual uma minoria étnica assimila a cultura da sociedade que a acolhe e, assim, deixa de existir enquanto minoria”. Essa perspectiva desenvolveu-se principalmente em Estados modernos como Estados Unidos e Austrália, países que devem sua formação aos imigrantes. Pensada para se apresentar como um processo natural de modernização, a assimilação subtende que a sociedade é acolhedora e aberta, se impondo pouco aos imigrantes.

Hobsbawm afirma sobre os norte-americanos:

Em certo sentido, o que se defende é a ideia do “nós” como um corpo de pessoas unidas por um número incontrolável de coisas que “temos” em comum – um “estilo de vida”, no sentido mais amplo, um território comum de existência em que vivemos, e cuja paisagem nos é familiar e reconhecível. É a existência disso que fica com a entrada do que vem de fora. (HOBSBAWM, 2000, p. 280).

Após a Guerra, esse conceito perdeu a credibilidade entre as minorias, sejam elas: negros, que viam o processo como um sistema de colonização interno, ou judeus, que acreditavam que o processo não salvou seu povo do racismo e genocídio. Dessa maneira, era preciso rever o conceito de assimilação. 

O termo se estabelece através da relação entre minoria e maioria, que pode ser mais latente quando supostamente a cultura da maioria é adotada e incorporada pela minoria, processo denominado de aculturação. Este conceito, que muitos acreditam ter caído em desuso, é ultrapassado, já que não é possível ter uma cultura e depois outra.

Na relação entre a sociedade e os migrantes, antes de ascenderem socialmente estes devem incorporar a cultura moderna da maioria, a sociedade não tem interesse ou muito dificilmente terá interesse em adaptar esses imigrantes. Diante disso, alguns migrantes se integram na sociedade ‘acolhedora’, mas outros se tornam minorias, muito por conta dos seus laços étnicos não desaparecem, mesmo com o tempo e esforço da maioria. Assim, os laços são mais fortes do que a cultura imposta pelos países receptores.

Vem à tona, como resultado dessa relação, os preconceitos e discriminação por parte de certos indivíduos. A sociedade moderna não presta atenção às diferenças entre os grupos, nem mesmo como esses grupos foram incorporados nessa nova sociedade. Assim, há uma posição chamada de étnico-cultural, na qual um determinado grupo é visto como separado, a margem de outros grupos da sociedade. O conflito, ocasionado pelo processo de assimilação, fez com que se evitasse o uso do termo assimilação, assim, a política preferiu utilizar os termos integração e multiculturalismo.

Segundo Díaz-Polanco (2009), o império é uma máquina de integração universal, que com sua boca aberta e apetite infinito, convida a todos, pacificamente, a ingressar em sua cultura. O império não busca excluir as diferenças, ele incita os outros a penetrar em sua ordem. Conceituando o termo etnofágico, Díaz-Polanco (2009) afirma que o império tem um apetite de diversidade e quer digerir e assimilar o comunitário, além de engolir e devorar o “outro” e suas identidades étnicas.

Para Kuper (2002), o multiculturalismo é a retomada da cultura de caráter político, citando Terence Turner, ele afirma que o multiculturalismo é um o movimento para mudança, mas faz críticas. O autor afirma que o termo não se trata de um movimento social coeso. O multiculturalismo americano dissemina discursos para o fortalecimento das minorias e rejeita a ideia de que os imigrantes devam assimilar a cultura que predomina, além de negar que exista uma cultura predominante. Segundo Kuper (2002), a questão não é a existência de diferenças, mas sim o desprezo e preconceito com que muitos tratam essas diferenças. A cultura predominante – que consiste no branco de classe média, anglo-saxão, homem e heterossexual – impõe suas regras a sociedade, quem não se encaixa nesse padrão será estigmatizado por ser diferente.

Segundo os autores Akhil Gupta e James Ferguson:
O "multiculturalismo" é, ao mesmo tempo, um débil reconhecimento do fato de que as culturas perderam suas amarras e lugares definidos, e uma tentativa de substituir essa pluralidade de culturas na moldura de uma identidade nacional. Da mesma forma, a ideia de "subcultura" tenta preservar a ideia de "culturas" distintas, ao mesmo tempo em que reconhece a relação de diferentes culturas com uma cultura dominante dentro do mesmo espaço geográfico e territorial. (GUPTA e FERGUSON, p. 33, ).

As políticas multiculturalistas são ditadas pela identidade cultural, conceito ligado ao indivíduo, que possui um eu verdadeiro, eventualmente não correspondente à pessoa que ele parece ser. O indivíduo pode escolher ou mesmo ser forçado a disfarçar características de seu verdadeiro eu. Contudo, para Kuper (2002), identidade não é somente algo pessoal, ela precisa ser dividida no mundo e dialogar com os outros. O eu interior está unido a uma coletividade, seja uma nação, classe social, movimento 
político ou até uma minoria. Para que uma pessoa seja livre na esfera social que se encontra, seus valores precisam ser respeitados. Pensando assim, numa comunidade multicultural, as diferenças devem ser respeitadas e até mesmo estimuladas.

Os indivíduos se organizam em grupos e tem diversas identidades, que podem se basear em atributos como o sexo, a classe, profissão, etc. A identidade étnica se diferencia da identidade social pela herança cultural, como por exemplo, língua e religião. Além disso, em uma comunidade étnica existem diferentes maneiras de pensar o ser turco, negro ou chinês.

Mencionado no texto de Kuper (2002), Charles Taylor, define identidade em termos culturais e acredita que quando é estabelecida uma identidade cultural existe uma pressão para se viver de acordo com ela, mesmo que se abandone a própria individualidade. Já para outro autor, K. Anthony Appiah, existe um custo por se definir uma identidade cultural, pois, o indivíduo pode não estar disposto a seguir uma linha de partido ou aceitar um papel estereotipado. Quando um imigrante defende sua identidade e se estabelece em um país diferente do seu, a sociedade espera que suas características correspondam a expectativas rígidas sobre como ele deve se comportar. Há, portanto, 
maneiras preestabelecidas de ser, exigências a serem cumpridas.

A identidade é algo formado ao longo do tempo e não algo inato, já que é feita de processos inconscientes. Dessa forma, ela está sempre incompleta e sempre está sendo formada. Assim, em vez de falar da identidade como uma coisa acabada, deveríamos falar de identificação, e vê-la como um processo em andamento.

Para Díaz-Polanco (2009), existem identidades que aceitam o sistema, mas há outras que são capazes de resistir com certo êxito à individualização pós-moderna e podem elaborar alternativas de emancipação frente o sistema neoliberal. Os ingredientes que alimentam os projetos de rebeldia e a emancipação, e no amplo arco do “altermundismo”, em sua maioria, se inspiram na luta identitária.

Há muitos significados entrelaçados sobre multiculturalismo, dados pela própria polissemia da palavra. O principal significado se dá pela diversidade sociocultural e suas hibridações. É usado também para se referir as lutas por diversidade e propostas alternativas dos que lutam. Contudo, o seu real caráter é quando se dá um enfoque político, que contém uma concepção sobre a diversidade e como ela deve ser incorporada ao sistema de dominação. Consequentemente, é recomendado um conjunto de práticas e “políticas públicas” que devem ser adotadas a respeito das identidades, principalmente referente à neutralidade do Estado combinada com as “ações afirmativas” e as “discriminações positivas”.

Os conflitos descritos poderiam ser associados apenas a sociedades ocidentais modernas, mas para Kuper (2002), isso é um problema sério. Com as minorias, que tendem a ser mais afetadas por discriminação racial ou religiosa, é mais natural que reivindiquem o direito de ser diferente, mas para o autor, é mais sensato exigir um tratamento igual e semelhante aos membros da sociedade.

É preciso diálogo para lidar com os conflitos entre as relações. É complicado pensar em diálogo intercultural quando uma das culturas foi desenvolvida a partir de agressões à dignidade humana em nome da outra cultura ou mesmo encontros que levaram à extinção cultural. Diante de tantas diferenças, resta a dúvida sobre a justiça em tratar todas as culturas de forma igual ou ainda abrir espaço na cultura ocidental para novos elementos de culturas não-ocidentais. Para Souza Santos (2006) só é possível duas respostas para esses questionamentos: o fechamento cultural ou a conquista
cultural.

Sousa Santos completa (2006, p. 459):
O dilema da completude cultural pode ser assim formulado: se uma cultura se considera inabalavelmente completa não tem nenhum interesse em envolver-se em diálogos interculturais; se, pelo contrário, admite, como hipótese, a incompletude que outras culturas lhe atribuem e aceita o diálogo, perde confiança cultural, torna-se vulnerável e corre o risco de ser objeto de conquista. Por definição, não há saídas fáceis para este dilema mas também não penso que ele seja insuperável. Tendo em mente que o fechamento cultural é uma estratégia auto-destrutiva, não vejo outra saída senão elevar as exigências do diálogo intercultural te um nível suficientemente alto para minimizar a possibilidade de conquista cultural, mas não tão alto que destrua a própria possibilidade do diálogo (caso em que se revertera ao fechamento cultural e, a partir dele, à conquista cultural).

A identidade cultural não pode fornecer uma orientação para a vida, pois temos múltiplas identidades. Supondo que tenhamos uma identidade primária, muitos não querem se ajustar apenas a ela. É preciso questionar o mundo em que nos encontramos e assim dar margem para manobrar os diversos conflitos que virão. A cultura precisa nos estimular a nos comunicarmos através das fronteiras, sejam elas étnicas, nacionais ou religiosas.






Bibliografia

CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano: artes do fazer. Rio de Janeiro: Vozes, 1994. (Introdução Geral - p. 37-53 e Cap. IX: Relatos de espaço - p. 199-217)

DÍAZ-POLANCO, Hector. Diez tesis sobre identidad, diversidad y globalización. Centro de Investigaciones y Estudios Superiores en Antropología Social (CIESAS), México. 2009. Disponível em: Http://ciesas.edu.mx/proyectos/relaju/documentos/DiazPolanco_hector.pdf

GEERTZ, Clifford. “O mundo em pedaços: cultura e política no fim do século” In: Novaluz sobre a antropologia. Rio de Janeiro. Jorge Zahar Ed., 2001.

GUPTA, Akhil e FERGUSON, James. Mais além da “cultura”: espaço, identidade e política da diferença. In: ARANTES, Antônio A. (org.). O espaço da diferença. Campinas: Papirus, 2000. (p. 31-49)

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2011. (Cap. 1 e 2: A identidade em questão e O nascimento e morte do sujeito moderno - p. 1-46)

HOBSBAWM, Eric J. “Etnia e nacionalismo na Europa de hoje” In:Balakrishnan, G (org.) – Um mapa da questão nacional. Contraponto Editora, Rio de Janeiro, 2000.

LÉVI-STRAUSS, Claude. “Raça e história” [1952]. In: Lévi-Strauss, Claude. Antropologia Estrutural II. Trad. Chaim Samuel Katz. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1976 [orig. francês 1973], pp. 328-66

KUPER, Adam. Cultura, diferença e identidade In: Cultura: A visão dos antropólogos. EDUSC, 2002

SOUZA SANTOS, Boaventura de. Para uma Concepção Intercultural dos Direitos Humanos In A Gramática do Tempo. São Paulo: Cortez Editora, 2006

VERMEULEN, Hans. “Estados-nação e imigrantes: perspectivas teóricas” e “Imigração, integração e a dimensão política da cultura” In: Imigração, Integração e a Dimensão Política da Cultura. Lisboa, Edições Colibri, 2001

Política e Luta de Classes

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Dotado da voz para se comunicar, o homem, segundo Jacques Rancière aponta em O Desentendimento: Política e Filosofia (1996, p. 19), estabelece termos que designam o desagrado e a consequência de seus atos, sendo o nocivo e o justo, as palavras blaberon e sympheron. A primeira tem relação com o desagrado de um indivíduo por seu ato ou mesmo a ação de outro indivíduo, o dano. Já sympheron, é a relação de uma pessoa ou um grupo obtém uma vantagem em relação aos demais por conta de uma ação. Para Platão o justo na polis é não haver blaberon quanto há sumpheron.

Segundo o autor, que usa o livro V da Ética a Nicômaco, a solução para uma sociedade justa é não pegar mais do que a parcela nas coisas que são vantajosas e menos do que sua parcela das coisas que são desvantajosas. Levando em conta que o blaberon é o nocivo e o sympheron as coisas vantajosas. Começando então a falar sobre onde a política se inicia, Rancière informa que ela nasce quando já não é possível equilibrar os lucros e as perdas e quando se alegraram cedo demais em reconhecer a superioridade do bem comum.
É em nome do dano que lhe é causado pelas outras partes que o povo se identifica com o todo da comunidade. Quem não tem parcela – os pobres da Antiguidade, o terceiro estado ou o proletariado moderno – não se pode mesmo ter outra parcela a não ser nada ou tudo. Mas é também mediante a existência dessa parcela dos sem-parcela, dessa nada que é tudo, que a comunidade existe enquanto comunidade política, ou seja, enquanto dividida por um litígio fundamental, por um litígio que afeta a contagem de suas partes antes mesmo de afetar seus “direitos”. O povo não é uma classe entre outras. É a classe do dano que causa dano a comunidade e a institui como “comunidade” do Just e do injusto.

O povo aqui é aquele que, depois de livre, pode falar e decidir dentro da sociedade. Por isso, diante do poder exercido pelo povo na democracia, a luta de classes se instaura com cada vez mais força. Exemplo disso foi a última eleição para Presidente do Brasil, em 2014. Disputaram o cargo máximo do país, no segundo turno, o senador Aécio Neves e a então atual presidenta Dilma Rousseff. Em 27 de outubro, a vitória da presidenta Dilma foi muito criticada por círculos da direita no país.

Para o filósofo Vladimir Safatle, os mais perspicazes entendem que a eleição se ganha com um tom voltado à esquerda. Quando em 2002 Lula ganhou a eleição, o PSDB – partido de direita – possuía 40% dos votos, em média. Hoje chegou aos 48%. Não existe uma classe média que chegue aos 40% no Brasil. A luta de classe sempre existiu, com um terço de seus eleitores oscilando entre esses polos. Como um reflexo do conservadorismo brasileiro, apesar da vitória “esquerdista”, o Brasil vê a composição de seus ministros, vereadores, senadores, os mais conservadores da história.

Para Marcos Nobre, doutor em filosofia, as últimas eleições para presidente no Brasil foram uma guerra de classes no país e mostram que algo mudou no cenário político brasileiro. Em meio às manifestações contra a eleição, o filósofo aponta que isso é um avanço enorme na democracia. A direita descobriu um meio de manifestar em junho de 2013, enquanto a esquerda descobriu que pode ter mobilização de massa.

Esse conflito de interesses é resultado da política. Existe política quando existe uma heterogeneidade no processo. O seu princípio é a igualdade, para isso é preciso renunciar alguns benefícios e aceitar alguns danos. O que assegura o trânsito dessas relações é o poder.

Para Rancière, é antiga a luta de classes e para ele não é com essa luta que a política deve contar. A política se estabelece quando existe uma parcela dos sem-parcela, algo que envolva os pobres. É errado pensar que há política por conta da oposição dos ricos aos pobres. É a política, que consiste na interrupção da dominação dos ricos aos pobres, que faz com que os pobres existam enquanto instituição.

Baixo Impacto das Cotas Raciais no Mercado de Trabalho

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A população negra representa 54% dos brasileiros, de acordo com última pesquisa divulgada pelo IBGE, em 2015. Mesmo sendo a maioria, desde que o Brasil aboliu a escravidão em 1888, o negro (denominação usada pelo IBGE para designar indivíduos da cor parda e preta) revalece ocupando postos de trabalho precários. Contudo, ações afirmativas como a política de cotas, que tem como objetivo criar melhores condições de inserção na edução superior, influencia fortemente na inclusão do negro em cargos de melhores colocações no mercado de trabalho.

Os negros são sub-representados nas empresas, principalmente nos altos escalões. Em 2015, o IBGE publicou a pesquisa Principais destaques da evolução do mercado de trabalho nas regiões metropolitanas abrangidas pela pesquisa: Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre 2003-2015. Este relatório divulgou que o negro recebe em média 59% do salário dos não negros, exercendo a mesma função. A partir da última década houve uma melhora na qualidade de vida e remuneração dessa população. Contudo, é visível que a política de cotas teve baixo impacto na colocação no negro no mercado de trabalho, se analisarmos seu rendimento.

As cotas raciais são consideradas ações afirmativas criadas para dar acesso a negros, índios, e estudantes de baixa renda à universidades. Os candidatos devem ter concluído o ensino médio em escolas públicas. De iniciativa do Governo Federal, o sistema de cotas implantadas em universidades estaduais e federais do país, propiciam o acesso dos grupos mencionados à concorrência com o resto da população ao mercado de trabalho, já que consequentemente, o cotista, após concluir a graduação, sairá com maior grau de escolaridade e expertise.

É sabido que alunos provenientes do ensino público apresentam, por conta da falta de investimentos públicos, educacionais, além da má qualidade do ensino, menor acesso à educação superior pública. Dessa maneira, a medida é vista como uma redução da exclusão dessas minorias à vagas de emprego geralmente preenchidas por maioria branca. Para o economista e professor Marcio Pochmann, presidente da Fundação Perseu Abramo, as cotas são importantes para enfrentar um problema estrutural, contudo, não pode ser vista como uma solução, já que o problema é mais amplo. Para Pochmann:

Ela abre uma perspectiva para a construção de uma elite (intelectual) negra, que até então tinha o perfil branco. Mas para vencermos a desigualdade profunda é preciso, para além de consolidar as cotas, avançar na universalização com qualidade, sobretudo no sistema de educação brasileiro.

A educação superior brasileira vivia uma crise de crescimento no setor público e privado no início dos anos 2000. No público por conta da estagnação de recursos e vagas, enquanto o setor de educação privado estava sofrendo com a grande inadimplência e evasão de estudantes. Entre os anos de 2002 e 2011, cerca de 70% das universidades estaduais e/ou federais adotaram algum tipo de ação afirmativa para garantir vagas a estudantes. As universidades privadas instituíram o Prouni, que disponibilizou bolsas de estudos para estudantes carentes e negros.

As cotas sociocracias são uma realidade há pelo menos uma década, contudo, ganharam no ano de 2012 o impulso da Lei de Cotas, que até o final de 2016 reservará 50% das vagas em universidades públicas para estudantes negros e concluintes do ensino médio em escola pública. A Lei nº 12.711/2012 foi sancionada em agosto e garantiu a reserva de 50% das matrículas por curso e turno em 59 universidades federais e 38 institutos federais do Brasil.

Ações afirmativas são fatores de correção de desigualdades históricas e não, como o censo comum prega, uma medida que fere o princípio de igualdade. A Lei de Cotas garante a todos oportunidades de acesso à educação e consequentemente ao trabalho, conforme está previsto no Capítulo II da Constituição Federal sobre os direitos sociais:

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

Segundo o Supremo Tribunal Federal decidiu, por unanimidade, em abril de 2014, as políticas de ações afirmativas baseadas em critérios étnicos, que promovem o maior acesso de pessoas negras aos brancos de universidades públicas são necessárias e constitucionais. Elas tem a função de corrigir distorções culturais históricas que existem no Brasil.

Joaquim Nabuco e Gilberto Freyre, afirmavam que a liberdade conquistada com a abolição da escravidão, transforma-se em cidadania e ausência de preconceitos de raça. As desigualdades sociais que acompanhamos até hoje, passam a se ancorar na ordem econômica e cultural das classes sociais. Assim, cabe ao Estado incorporar e também regular o acesso dos cidadãos ao seus direitos, através de políticas sociais. Isso promove a justiça, saúde, educação e segurança desses povos, identificados como minorias.

Em agosto de 2015, três anos após a sanção da Lei de Cotas, o sistema público de universidades brasileira garantiu 111 mil vagas a estudantes negros em cursos superiores de universidades e institutos federais. Atualmente cerca de 1,8 milhão de jovens, quase metade negros, pressionam o mercado de trabalho em busca colocação qualificada, segundo o IBGE.

Segundo a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), o desemprego pode ocasionar dificuldades para a ascensão social da população negra. A adoção de ações afirmativas seria uma estratégia para mitigação desse risco. Florestan Fernandes já em 1979 acreditava que:

Com o emprego o negro pode conquistar mais facilmente a base para a participação institucional de que esteve quase completamente excluído e pode montar novos projetos de vida (...).

A promoção da desigualdade e o combate a discriminação racial constituem dois lados de uma mesma moeda. Elas devem ser estratégias complementares. Quando se trata de promoção da diversidade se fala em querer construir. Já quando o assunto é combate à discriminação é algo que precisa se desmontar. É preciso das duas coisas para garantir equidade no mundo empresarial.

Não se pode implementar ações afirmativas de inclusão na educação e não discutir políticas públicas de inclusão do negro no mercado de trabalho de forma a igualar os direitos de negros e brancos que possuem mesma escolaridade e qualificação.

Da mesma maneira que não se pode implementar ações afirmativas de inclusão na educação e não discutir políticas públicas de inclusão do negro no mercado de trabalho de forma a igualar os direitos de negros e brancos que possuem mesma escolaridade e qualificação.

Não pode ser tolerado

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Um domingo não é só um domingo. Principalmente quando você reconhece mais um sinal de que há algo errado no mundo.

Uma conversa displicente na porta de casa torna indefensável dois amigos acusados de práticas libertinas a luz do dia.

A mão pousada no ombro do amigo é uma evidência de que um rapaz é homossexual.

Um primo jamais poderá se encontrar com o outro se o último for considerado homossexual.

Uma mãe nunca deixará que se encontrem, pois pode ser penalizada pelo pai do menor.

Um dia regado a jogos de vídeo game não mais será tolerado, afinal, "você já viu as fotos no Facebook dele?"

Não ter uma namoradinha, mas trabalhar e estudar são indícios de envolvimento com o primo.

Nas sextas-feiras, o filho menor será levado para conhecer bares e aprender como ser "homem".

Informações irrelevantes como o primo ter namorada, não são levadas em consideração pelo pai preconceituoso.

Nada será discutido ou averiguado, apenas julgado e condenado.



Apenas por curiosidade, informo alguns números:


  • O Disque 100 recebeu quase 2 mil denúncias de agressões contra gays, em 2015;
  • Desde o início de 2016, 132 homossexuais foram mortos no Brasil;
  • A cada 28 horas, um deles morre de forma violenta no país.




Idealizadores X Apoiadores

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Reparem numa coisa aqui.
A vida da gente pouco é definida pelos nossos desejos. Explico: você pode até querer muito fazer uma coisa, mas seus atos serão determinados pelos apoiadores.

Sabe o que é? Idealizadores tem aos montes nesse mundão de meu Deus. Mas a verdade é que sua ideia de bosta só poderá ser realizada se houver aquele cara que apoia sua loucura.
Esse cara pode ser um amigo maneiro ou ainda aquele que  banca($) suas estripulias.

Acontece assim, alguém muito esperto decidiu contratar uma estilista para fazer os uniformes dos responsável pela entrega das medalhas nos Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio 2016 e pediu que fosse retratada toda nossa brasilidade.

Por exemplo, as Olimpíadas 2016 será em terras tupiniquins. O site oficial do evento já avisa pra você se preparar para "disputas emocionantes de 42 esportes Olímpicos, incluindo a estreia de golfe e rugby". Mas deveria informar sobre os uniformes que serão usados na entrega das medalhas.

Não deu outra, apresento a apoiadora:

“A ideia foi criar algo que ressaltasse a elegância tropical. Que fossem looks leves e descontraídos como os cariocas são e, ao mesmo tempo, estivessem alinhados ao contexto do evento”, disse a apoiadora estilista ao FFW.


Dadãã!
Croquis dos uniformes femininos desenhados por Andrea Marques


Que tal? Ainda não se decidiu? Te ajudo!

Uniformes da equipe de entrega de medalha



Por que não basta achar que o Brasil é um país tropical e cheio de festa se não tem quem apoie essa ideia. Esteriótipos devem ser reforçados não é mesmo?

Começa em 05 de agosto.
Bons Jogos!

Sei lá

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Ela vivia com a cara enfiada no celular.
Às 6 da manhã acordava e corria para a academia. Na volta, banho e trabalho.
No trabalho muito estresse.
Indo pra casa, a cara enfiada no celular.
Em casa, um oi e comentários sobre a novela.

A vó, sempre falastrona e disposta a conversar, contava todos os casos da vida, as histórias mais mirabolantes e os triunfos mais comentados na família.
Ela, olhar de desinteresse.
Dias e dias disso.

Mas um dia, a vó não se lembrou dela. Com olhar vazio, ouvia a pergunta da médica:
- Quem é essa moça?
- Sei lá, a vó respondeu.

S-E-I-L-Á!
Foi um choque imediato.
Como assim, a falastrona, cheia de casos para contar, não sabia quem era ela?
Justo a vó! Não podia ser.

A vida é deveras estranha, não é?
Quando se perde, se dá conta de que tinha tudo.

Livros de julho

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Disposta a terminar a leitura de livros esquecidos na prateleira, informo que me comprometo com essas leituras no mês de julho!

Outlander - A Viajante do Tempo, de Diana Gabaldon


Já assisto a série e como boa jornalista que sou, investiguei o que pude sobre a história. Estava na hora de ler os livros e acompanhar com mais propriedade.

As páginas sobre essa produção no Facebook não polpam esforços quando querem nos dar spoilers.

Tive que me render aos livros.

Não que eu não goste de ler livros que foram adaptados, pelo contrário! É que essa série em especial tinha me fisgado mesmo.

A Sombra do Vento, de Carlos Ruiz Zafón

Esse é desses livros que todo mundo diz que é maravilhoso! Mas eu abandonei (risos nervosos).

E não foi por que eu não estava gostando, como pode ser lido no meu histórico de leitura do Skoob que eu transcrevo abaixo:

8/01/2016
14% (85 de 608)
"extremamente envolvida" Nota: 5

14/01/2016
8% (51 de 608)
"Completamente encantada pela forma de escrita desse autor" Nota: 5

O fato é que, apesar de "completamente encantada" e "extremamente envolvida", eu estava na saga da entrega do TCC da pós-graduação, amigos.

Aí, deixei ele de lado e quando tive tempo, comecei a ler outras coisas.

Morro dos Ventos Uivantes, de Emily Brontë

Esse eu abandonei... Podem me julgar!

Eu sou hiper fã de Jane Austen e sabe-se lá onde eu li que poderia gostar desse livro.

Eu parei de ler, não por que eu tenha odiado a história, mas é que eu gosto de me divertir mais com as minhas leituras.

Portanto, posterguei.

Mas a vida é feita de responsabilidades, não é mesmo? Então, eu vou terminá-lo!

Recomeço

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Há tempos eu venho tentando dar um rumo para esse blog. Tenho a péssima mania de achar que antes de escrever algo tenho que ter muita certeza. Além disso, fico imaginando um jeito de segmentar o blog e escrever só sobre um assunto.

Grande erro.

Eu preciso entender que a internet é terra de ninguém. Posso escrever sobre o que quiser.

Sou livre.

Se hoje quero falar de uma série, ok. Se amanhã quero discutir política, melhor.

Mas estou numa vibe mais cultural.

Melhor ainda, estou querendo colocar minhas leituras em dia!

Tenho tantos livros não lidos e tantos outros na fila para compra que já perdi a conta.
Então, vou usar esse espaço para listar minhas metas de leitura e dizer um pouquinho o que achei desses livros.